Um Mundo Escuro

Tempos atrás, o jornalista J. R. Guzzo publicou um artigo na revista Veja intitulado “Um mundo escuro”. Chamava nossa atenção para o perigo dos grupos que pretendem controlar a sociedade, impondo crenças que são só deles. Depois escreveu que “uma das atividades que mais crescem no mundo de hoje é a que se propõe a controlar as atividades dos outros – um lobby tão forte quanto qualquer dos que existem e, por isso mesmo, tão perturbador como todos eles”.

Também perturbador, a meu ver, é o fato de que certas crenças conquistam com facilidade parte da opinião pública, que não exerce seu espírito crítico para saber que está diante de raciocínios aparentemente lógicos, construídos sobre premissas falsas. O Whatsapp é um forte instrumento neste campo, com os seus posts mal explicados e fora de contexto, às vezes completamente mentirosos.
Temos pela frente a Epidemia do Bem e a Ditadura do Bem, dois movimentos voltados para o bem, podendo atingir resultados diametralmente opostos. É importante refletir sobre eles para não fazermos abordagens equivocadas.
Uma “epidemia” é um “ponto de desequilíbrio” (Malcolm Gladwell, Ed. Rocco). É quando um novo conceito se espalha exponencialmente, da mesma forma que a sociedade passou a restringir o hábito de fumar em recintos públicos, incentivou as viagens para a Disneyworld, adotou os shopping centers, voltou-se para o culto ao corpo, e assim por diante.
A epidemia do bem se apresenta na necessidade de viver de acordo com os melhores conceitos éticos e ecológicos, e está crescendo. Centenas de empresas adotaram a sustentabilidade em suas práticas e em sua comunicação. As cartas dos leitores dos jornais e revistas, bem como uma infinidade de posts na internet e alguns protestos realizados nas ruas refletem uma preocupação crescente com a ética, ou uma indignação com a falta de ética. É uma epidemia, mais ou menos forte aqui e ali, mas ainda não totalmente disseminada.
O problema é a ditadura do bem, que nasce da intolerância com as diferenças e procura regular as relações sociais através dos seus valores únicos. Tem ditador para criar leis e regulamentos contra ou a favor de tudo: bullying, cor da pele, homofobia, gênero, alimentação e consumo de produtos, convicções políticas, prestação de serviços e de mídia. Os ditadores que, diga-se de passagem, nem sempre concordam entre si, têm a preocupação de regular o comportamento humano em todos os aspectos. Em nome do bem, estão sempre à procura de desmoralizar ou de impor proibições, limites, multas, ações na justiça.
Eu e muitos outros nos preocupamos com todas essas questões, mas do ponto de vista da valorização da diversidade, inclusive quanto à liberdade de expressão e de escolha. Somos publicitários, nossa missão é propagar ideias, criar novas ideias, inovar. E, desde que a ética seja preservada, não queremos limitações. Acreditamos que a sociedade inteligente também não queira.
Que fique registrado aqui um altissonante NÃO aos controladores, limitadores, reguladores, castradores da pluralidade social e intelectual. É também um convite à reflexão. Afinal de contas, qual será o resultado decorrente de certas propostas que pretendem construir um mundo melhor, porém amparadas em falsas premissas?

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